Matéria - Revista Isto é Dinheiro
Editora Três Ltda. (No. 076 – 10 de Fevereiro/1999 – Negócios - página 52 e 53)
Alimentos
VIGOROSO AVANÇO
A Vigor, de Carlos Alberto Mansur, surpreende o mercado com lançamentos inéditos e operações internacionais
Ambos ajudavam o pai numa pequena papelaria na rua 25 de Março, centro de São Paulo. Enquanto vendiam canetas, blocos, pastas e afins, iam sonhando um futuro dourado no campo dos negócios. Ricardo, o mais velho, já havia traçado todo o plano: assumiria a papelaria, venderia, entraria em novas sociedades, venderia, e continuaria com a prática até dar um grande salto. Carlos Alberto, o mais novo, ouvia atentamente os planos do irmão. Quase sempre apoiava. E assim se fez. Em poucos anos de seguidas compras e vendas, os dois irmãos se tornaram sócios de uma respeitada indústria de laticínios, a Vigor. E compraram a Leco, a Flor da Nata e a Refino de Óleos Brasil. Ainda fizeram uma joint venture com a dinamarquesa MD Foods (criando a marca Danúbio). Mas o destino os separou. Ricardo queria mais e foi se aventurar no varejo. Carlos Alberto comprou a parte dele e ficou com o título de “Rei da Nata” — denominação, aliás, que os dois detestam.
Esses são os irmãos Mansur. Mas hoje em dia é melhor nem tentar convidá-los para o mesmo jantar. Carlos Alberto costuma dizer que “não tem e nem terá nada a ver com o Ricardo”. O motivo da distância entre os dois nunca foi muito bem explicado, mas remonta aos tempos de convivência societária na Vigor. Carlos Alberto quer seguir seu destino sem a sombra do irmão, ainda que tenha um longo caminho a percorrer para alcançar as cifras do primogênito do sr. Mansur. Neste ano, as primeiras mexidas. O hiperdiscreto dono da Vigor resolveu dar maior visibilidade ao negócio e, mais que isso, correr atrás das concorrentes multinacionais que diariamente vão invadindo segmentos diferenciados no setor de alimentos. A primeira providência do empresário foi montar um departamento de marketing na Vigor. Isso mesmo. A empresa nunca havia organizado uma equipe para trabalhar embalagens, criar estratégias de desenvolvimento de produtos, táticas de pontos-de-venda. Em meados do ano passado, Mansur mandou buscar o executivo Antônio Carlos Prado, ex-Arcor do Brasil, Colgate e Cica. Prado veio, montou a equipe e até o final do ano já havia lançado 11 produtos. “Precisávamos encostar em grandes concorrentes como Danone e Parmalat”, diz o diretor de Marketing.
O primeiro lançamento foi um sucesso. A vitamina Leco em embalagem Longa Vida, que consumiu investimentos de R$ 2 milhões, já chegou ao mercado premiada: ganhou o FI South America 98 Award de produto mais inovador. Seguiram-se as margarinas com manteiga, os requeijões com sabores e até um suco de laranja — segmento inédito na história da companhia.
Papéis: A empresa pretende captar US$ 150 milhões no Exterior
Neste ano, os planos da Vigor são ainda mais ousados: o lançamento de 20 produtos. “Até junho, teremos pelo menos dez itens novos”, diz Prado.
Enquanto o diretor de Marketing se entope de idéias (até um isotônico está nos planos da companhia), o diretor que cuida da parte financeira, Marco Antônio Panza, faz contorcionismos para adequar as verbas ao projeto de lançamentos. “Em princípio, a desvalorização não deve nos causar problemas. Temos eurobônus de US$ 50 milhões, emitidos em outubro de 1997, mas o valor está todo ‘hedgeado’ em varias operações em dólares”, afirma. Além desses US$ 50 milhões, a companhia planeja captar mais US$ 100 milhões em duas novas emissões. Também estreou na bolsa de Nova York, na quarta-feira 3, com o lançamento de ADRs. “Por enquanto tudo está indo bem”, garante Panza. A operação com ADR surpreendeu o mercado. “A Vigor lançou papéis de nível 1, negociados em balcão. A estratégia está correta, se a idéia for trabalhar a imagem e aumentar o volume de negócios das ações”, diz Alex Mainero, diretor do Citibank. “O único problema é que as ações da empresa não têm tantas transações no Brasil. Seria prudente desenvolver suas operações aqui primeiro.”
Mudanças. A única empresa de lácteos de capital nacional sabe que cada minuto é precioso na corrida contra as multinacionais. Diversificação é palavra de ordem nos corredores da companhia e programas de expansão vão sendo montados diariamente. A companhia, que até 1997 restringia sua atuação a São Paulo, abriu filiais de venda em quase todas as capitais brasileiras. Carlos Alberto Mansur não poupa investimentos, mesmo diante do atual cenário econômico. Amigos dizem que ele está mudando, que a visibilidade fará parte de seu cotidiano. Concorrentes afirmam que ele foi obrigado a sair da toca sob pena de perder ainda mais espaço. Os números, por enquanto, vêm dando razão aos rivais. De janeiro a setembro de 1998 (últimos dados da companhia), o lucro liquido apresentou uma redução de 13,4% em relação ao anterior. E bem verdade que o volume de vendas e o faturamento cresceram, mas as margens ainda se mostram achatadas em relação à concorrência.
“O jogo está apenas começando”, diz Prado, do Marketing. Pelas mudanças que estão sendo implementadas na Vigor, a impressão é de um otimismo generalizado na companhia. Só não se esqueçam do sobrenome do dono da empresa. A família Mansur tem uma forma peculiar de tratar de negócios. Compra e vende com a maior naturalidade e não se apega a tradições e logotipos. Essa história de trabalhar a imagem aqui e acolá atiça a cobiça de investidores. “A Vigor está na ponta compradora”, garante Prado. Pode ser, mas vira e mexe a companhia recebe propostas de concorrentes de peso. E agora está mais vistosa do que nunca.
Darcio Oliveira
O Rei da Nata: Carlos Mansur reforça sua companhia para enfrentar Parmalat e Danone.